Eles são carismáticos, se vestem bem, tem sorriso fácil e quase nenhuma experiência prática.
Encantam os mais românticos com retóricas cheias de persuasão e termos em inglês, prometendo resultados que não sabem como conseguir.
Líderes de palco costumam ter boa eficiência na comunicação, mas pouca eficácia. Ou seja, falam de maneira eficiente (meio), mas o que dizem não é eficaz (resultado).
Permita-me dar um exemplo:
Precisamos setar nosso Mindset pra a inovação. É o que o Board da companhia espera de nós. Pois, nesse mundo digital, V.U.C.A, quem não se reinventar vai ficar obsoleto. Nossos stakeholders esperam ações e resultado Disruptivos. Com espírito Empreendedor devemos adotar a rapidez de uma Startup e encontrar nosso Break-even para operar. Despertem o tigre que vive dentro de cada um de vocês e vamos conquistar o mundo!
Quantas verdades tem nessa fala (eficiência)? Algumas. O quanto ela foi clara e direcionou o time sobre o que fazer (eficácia)? Pouquíssimo.
Na Grécia antiga, berço da democracia e da retórica, aquele que almejasse a liderança deveria desenvolver habilidades em comunicação e persuasão.
Desde então, espera-se que os líderes sejam excelentes comunicadores, entretanto, a realidade é outra.
A maioria dos líderes não são bons comunicadores.
Esse é o outro lado da moeda.
No entanto, em um mundo moderno, informativo e mais conectado, o sucesso do líder não depende (somente) de boa comunicação e de seu poder de persuasão.
Sua reputação está intimamente conectada ao seu sucesso.
Barry Posner e James Kouzes, no livro “O Desafio da Liderança”, apresentam uma pesquisa sobre liderança realizada ao longo de 30 anos e com mais de 100 mil pessoas ao redor do mundo.
A pesquisa pedia pra que as pessoas apontassem 7, dentre 20 características que mais buscavam e admiravam nos líderes.
Os resultados da pesquisa apontaram para Honestidade como a característica principal de um líder que alguém estaria disposto a seguir (voltaremos a falar sobre as outras 6).
Seria essa qualidade algo impossível para líderes de palco? Esses líderes agem assim por má fé ou por imperícia?
Excelentes perguntas caro leitor!
Mais adiante voltaremos a falar sobre essas e outras implicações para empresas, carreiras e indivíduos.
Antes, permita-me esclarecer o que é exatamente essa tal de gourmetização.
GOURMETIZAÇÃO?
Nos últimos anos um raio gourmetizador atingiu em cheio alguns pratos de nossa culinária.
A barraquinha de sanduíche virou foodtruck, o picolé virou paletas. E a pamonha vinda de Piracicaba virou massa de milho verde orgânico aglutinado com leite de côco e açúcar…
Claro que a ideia era empacotar deixando tudo mais bonitinho e com isso aumentar o preço.
Pois bem, não foi só a culinária que foi atingida pelo raio gourmetizador não, o mundo corporativo também foi. Um prato cheio para os líderes de palco.
O dono da firma virou empreendedor, a firma virou startup, chefe tem que ser líder disruptivo, funcionários são headcounts, stakeholder são os antigos clientes, budget é o orçamento da área, Co-working é o novo escritório, Networker é o cara bom de relacionamento e por aí vai.
A brincadeira é provocativa e talvez faça você pensar — Ah, mas, tirando uma coisa ou outra, são só termos em inglês que basta traduzir.
Não seria implicância com o inglês?
Não diria que uma implicância com a língua da rainha, ou mesmo com a gourmetização do discurso ou da persona do líder, mas, decerto um pequeno aborrecimento pelo uso apelativo do inglês para florear um discurso eficiente, porém, vazio e sem sentido, em detrimento de um mais simplificado, contudo, eficaz.
LÍDERES DE PALCO NUNCA ENTREGAM O QUE PROMETEM
Outro dia me inscrevi pra um mega webinar para Gestores e líderes na era 4.0.
No convite, que chegou por e-mail, a chamada era: “Conheça os principais conceitos e ferramentas da gestão e liderança pra uma era moderna, colaborativa, conectada e em constante mudança”.
Fala sério, tinha tudo pra ser incrível. Imagine só todos os desdobramentos práticos de tudo isso.
Mandei logo em um grupo de amigos no WhatsApp, todos gestores e líderes.
— Rapaziada segue convite para webinar sobre gestão e liderança. Se inscrevam aí que parece que vai ser legal.
No dia do evento, 30 minutos depois do início, começou a pipocar mensagens no grupo:
— E aí senhores, o que tão achando? Perguntou o primeiro.
20 segundos depois…
— Bicho, acho que perdi tempo hem!
— Puts, você acha? Fui…
— Senhores, a galera não tá entregando o que prometia no convite, tô saindo fora também.
Assim, um por um, foram deixando a webinar.
E eu, com cara de ué, só restou pedir desculpas pela indicação furada, pegar meu banquinho e sair de fininho (essa é pra quem lembra do Raul Gil).
O pecado dos caras da webinar?
Ah, você já deve estar imaginando: mais do mesmo…
Gourmetização das falas, ideias, conceitos, que perfumam o discurso, deixando-o bonito, híbrido (dois ou três idiomas), mas, muito pouco pragmático.
Em síntese, era um encontro de líderes de palco, de Power Point, de teoria, que falam, falam, falam e nunca dizem nada.
A GOURMETIZAÇÃO ENFEITA O PAVÃO, MAS, NÃO RESISTE AO TEMPO
Um gourmetizador de palco consegue se manter por algum tempo. Quando ele é bom nisso as pessoas se apaixonam por ele com facilidade.
É o famoso efeito lua de mel. Porém, o efeito passa, e quando isso acontece o que deveria ficar são as qualidades; os resultado; a reputação.
E é exatamente o que o grande líder de palco não tem.
Via de regra, o mercado não respeita pseudos especialistas que sabem enfeitar o pavão como ninguém, mas que não tem resultados; bagagem, experiência, história.
Tá cheio de especialistas por aí cheios de fé falando sobre como construir, motivar equipes e gerar grandes resultados, mas, que nunca fizeram isso na prática.
Mas, já dizia Tiago, o da bíblia, “A fé sem obras é morta” [Tg. 2:17).
Um amigo sempre diz que essa galera, os líderes gourmets, são verdadeiros ninjas.
Não no sentido de expertise no que fazem, mas, no sentido de que jogam aquelas bombas de fumaça que ludibria e embaça a visão de todos impedindo que vejam a situação real, aí, depois eles somem.
O que segundo Posner e Kouzes, na pesquisa que citamos acima, não é algo legal.
Retornando a pesquisa, das sete características que as pessoas procuram no líder, logo depois de Honestidade vem: prospectivo, competente, inspirador, inteligente, aberto e justo.
Qualidades essas que só são provadas com e pelo tempo.
Teria esperança para um líder de palco?
NA PRÁTICA A TEORIA É OUTRA
T.S. Eliot, disse na peça The Cocktail Party:
“Metade do estrago causado neste mundo são porque pessoas querem se sentir importantes. Elas não querem lesar: estão cegas, em sua luta infinita para pensarem bem de si mesmas.”
Se considerarmos o que disse o poeta e dramaturgo, podemos entender que líderes de palco não fazem o que fazem propositalmente, tudo é uma questão de ego ou incompetência.
Acho que na tentativa de ajudar, piorei a coisa. Paciência…
A verdade é que empresas e líderes dependem de resultado para sobreviver.
E esses resultados dependem de gente, em todas as pontas: do líder, dos funcionários, fornecedores, clientes e consumidores.
Aquele discurso que brincamos no início do artigo, o discurso no viés; líder de palco, não tende a ajudar muito.
Pelo contrário. Na prática a teoria é outra e exige mais comprometimento da liderança.
Como diz o poeta nos versos da música Da ponte pra cá: “Não adianta querer, tem que ser, tem que pá, o mundo é diferente da ponte pra cá”.
Precisamos de líderes, de bons líderes.
O mundo perfeito seria o da eficiência de braços dados com a eficácia.
Quando esses dois elementos são encontrados na liderança, a empresa e seus profissionais prosperam.
No entanto, se não pudermos ter os dois juntos, arrisco dizer que a eficácia do discurso, isto é, o que gera os resultados, sempre será mais importante que sua eficiência; meio/forma como a mensagem é passada.
Depois de ter escrito o parágrafo acima, confesso que achei ele meio perigoso, mas resolvi deixar. Os Gregos antigos que me perdoem.
E QUAL A RESPOSTA PARA ESSE DILEMA?
A verdade é que talvez não tenhamos respostas definitivas para todo esse dilema.
Mas, apesar de toda pré-ocupação com o movimento de líderes de palco, que cada vez mais gourmetiza o discurso, mata a produtividade e pode prejudicar carreiras, temos pistas de como seria o líder antagônico ao modelo de palco.
Claro que um líder com todas as 7 características que falamos talvez seja utópico, no entanto, honesto e de boa reputação, o que está intimamente conectado com o estilo Walk the talk, é vital para o sucesso. Da empresa e da carreira do próprio líder.
Gosto da metáfora do líder sol, que ilumina os caminhos e aquece os corações de sua equipe.
Nesse sentido, remover os entraves do percurso e aquecer o coração das pessoas, passa sim pela comunicação, mas não só.
A eficiência na mensagem será sempre um grande diferencial do líder, entretanto, a eficácia do que se fala é o que garante que um líder não foi criado para o palco apenas, mas para levar empresas e liderados a um lugar de destaque.
Até à próxima!
O assunto é denso e polêmico a não há como esgotá-lo em poucas linhas, muito menos sozinho. Gostaria muito de saber o que pensa a respeito e quais pistas tem para um caminho mais eficaz.
Deixe nos comentários ou me mande um e-mail. Eu adoraria saber.
Achiles Rodrigues